Qual o melhor tratamento para úlceras de membros inferiores?

| 20 julho 2009 | ID: sofs-1232
Solicitante:
CIAP2:
DeCS/MeSH:
Graus da Evidência:

Inicialmente é muito importante fazermos o diagnóstico preciso do tipo de úlcera que o paciente apresenta para que possamos individualizar o tratamento e tomar conhecimento das possíveis complicações. Segue abaixo uma diferenciação diagnóstica de cada tipo de úlcera de membros inferiores.
Diagnóstico Diferencial das Úlceras de Membros Inferiores
ISQUÊMICA
Causa: Arteriosclerose obliterante, tromboangeíte, oclusão arterial aguda.
Localização: Dedos, pé, calcâneo, terço distal da perna
Dor: Intensa
Número: Única
Outros dados: Bordos irregulares com base pálida
VENOSA
Causa: Estase venosa, fístulas arteriovenosas, malformações vasculares
Localização: Perimaleolar e medial
Dor: Leve
Número: Única
Outros dados: Bordos irregulares, base com granulação, pigmentação.
ISQUÊMICA FOCAL
Causa: Angeítes sistêmicas, microembolismo, Raynauld
Localização: Terço médio da perna e dedos
Dor: Moderada a intensa
Número: Várias
Outros dados: Inicia com infartos únicos ou múltiplos da pele.
HIPERTENSIVA
Causa: Hipertensão arterial sistêmica (HAS)
Localização: Perna distal póstero-lateral
Dor: Extremamente intensa
Número: Única e grande com satélites
Outros dados: Inicia com infartos, progride com áreas purpúricas.
NEUROTRÓFICA
Causa: Neuropatia e trauma repetido
Localização: Sob calos plantares e proeminências ósseas
Dor: Ausente
Número: Única
Outros dados: Indolente, profunda e infectada
HEMATOLÓGICA
Causa: Anemia falciforme, talassemia, esferocitose
Localização: Tornozelo e pé
Dor: Ausente a leve
Número: Única recorrente
Outros dados: Pode ocorrer em áreas de pigmentação, anemia crônica
TRATAMENTOS
Para ÚLCERAS VENOSAS os melhores tratamentos são:

A compressão deve ser usada em pessoas com úlceras venosas que tenham um adequado suprimento
arterial do pé e que não tenham diabetes nem artrite reumatóide. A efetividade das meias e bandagens de compressão dependem da habilidade do paciente em aplicá-las.
Em pessoas em uso de compressão deve-se cobrir a úlcera. Há várias opções para isso e todas mostraram-se igualmente efetivas (curativos adesivos prontos de hidrocolóide, gaze embebida em dersane, filme plástico ou gaze úmida com soro fisiológico).
O paciente deve ser orientado a colocar a compressão (meia ou bandagem) ao acordar-se pela manhã e só retirar ao deitar-se à noite. O tempo para cura é variável, mas pode-se esperar bom resultado em 12 a 16 semanas. Mesmo após a cura da úlcera a compressão é comprovadamente efetiva na prevenção de recorrência de úlceras venosas.
Marcas de meias elásticas no mercado: Sigvaris®, Selecta ®, Jobst®, Venosan®, Segreta®, Kendall®, entre outras.
Para indicar o uso devemos medir o membro sem edema no tornozelo, panturrilha e coxa para que o paciente adquira a meia de tamanho adequado.

São fabricados com uma camada de material (um fármaco) preenchedor (diversos tipos são usados) seguidos uma a quatro camadas de bandagens elásticas. Um estudo mostrou superioridade clínica do uso de três camadas contra o uso de quatro camadas. São curativos industrializados e geralmente caros no nosso meio.

É um curativo inelástico de camada única
A bota de Unna é o curativo com bons resultados mais usado em saúde pública no Brasil por ter um custo relativamente baixo. É um composto de óxido de zinco, glicerina, loção de calamina (opcional) e gelatina envolto por ataduras. Pode ser elaborado em farmácias de manipulação ou comprado pronto. É trocado 1 vez por semana ou até a cada 2 semanas.
Para sua colocação, a perna deve ficar elevada durante toda a noite anterior e o tecido necrótico, se houver, deve ser previamente debridado. A bota é aplicada diretamente sobre a pele, estendendo-se da articulação metatarsofalangeana até um pouco abaixo do joelho. O tempo de existência da úlcera e seu tamanho permitem estimar a probabilidade de que ela cicatrize com o uso da bota de Unna. Úlceras com mais de 6 meses e maiores de 5 cm tendem a demorar mais para fechar.
A bota de Unna está contra-indicada na suspeita de arteriopatia periférica ou infecção local.
Com a bota o paciente deve ser orientado a deambular o máximo possível para se evitar a anquilose.
Todos os tratamentos acima tem suas efetividades comprovadas por ensaios clínicos randomizados de boa qualidade. Um estudo de boa qualidade não mostrou diferença entre curativos elásticos multi-camadas de alta compressão, badagens curtas elásticas e bota de Unna.
Uma série de outras opções tem sido usadas, mas ainda sem dados suficientes para atestar seus efeitos.

São eles:

Os flavonóides orais parecem exercer, também um efeito benéfico para o fechamento destas úlceras.
Com relação à prevenção de recorrência, além da compressão, cirurgia de varizes, também é efetiva.
É importantíssimo fazer o correto diagnóstico do tipo de úlcera para se aplicar o tratamento específico para cada tipo de úlcera de MMII.

Encontramos uma revisão sistemática na base de dados Cochrane que tinha como objetivo principal determinar se os agentes tópicos ou curativos afetavam as taxas de cura de úlcera arterial. Os autores relatam ter encontrado apenas dois Ensaios Clínicos Randomizados que preenchiam os critérios de inclusão, porém os estudos tinham pequeno tamanho amostral. Um dos estudos comparou o uso de ketanserin 2% ungüento em polietilenoglicol com polietilenoglicol ungüento de forma isolada trocado duas vezes ao dia. Não se observou diferença nos dois grupos em relação à melhora das úlceras. O segundo estudo que foi incluído na revisão sistemática estava relacionado ao controle de úlceras arteriais em pacientes diabéticos e demonstrou que as úlceras tratadas com óleo essencial melhoraram em 176 dias e aquelas tratadas com cuidados convencionais não melhoraram.

A conclusão dos autores é de que as evidências são insuficientes para determinar se a escolha de agentes tópicos ou curativos afetam as taxas de cura de úlcera arterial em membros inferiores.

Uma revisão sistemática encontrada na Cochrane tinha como objetivo avaliar os efeitos de curativos
com prata comparado ao uso de agentes tópicos nas taxas de infecção e cura de úlceras de pé pacientes diabéticos. Essa revisão sistemática não encontrou nenhum estudo que preenchesse os critérios de inclusão. Os autores dessa revisão concluíram que apesar do uso corriqueiro de curativos e agentes tópicos contendo prata para o tratamento de úlceras em pacientes diabéticos, não foram encontrados estudos com adequado rigor metodológico que avaliassem a efetividade clínica desses tratamentos.
Para os outros tipos de úlceras não foram encontrados estudos comparativos para seu tratamento.

 


Bibliografia Selecionada:

  1. Pereira AH, Grüdtner MA, Boustany SM. Doenças do sistema venoso. In: Duncan BB, Schmidt MI, Giugliani ERJ. Medicina ambulatorial: condutas de atenção primária baseadas em evidências. 3a ed. Porto Alegre. ArtMed; 2004. P. 1094-9
  2. O’Meara Susan, Cullum Nicky A, Nelson E Andrea. Compression for venous leg ulcers. Cochrane Database of Systematic Reviews. In: The Cochrane Library, Issue 2, Art. No. CD000265. Disponível em: http://cochrane.bvsalud.org/doc.php?db=reviews&id=CD000265
  3. Pitta GBB, Castro AA, Burihan E, editores. Angiologia e cirurgia vascular: guia ilustrado. Maceió:UNCISAL/ECMAL; 2000.
  4. Bergin Shan, Wraight Paul. Silver based wound dressings and topical agents for treating diabetic foot ulcers. Cochrane Database of Systematic Reviews. In: The Cochrane Library, Issue 2, Art. No. CD005082. Disponível em: http://cochrane.bvsalud.org/doc.php?db=reviews&id=CD005082
  5. Nelson E Andrea, Bradley Matthew D. Dressings and topical agents for arterial leg ulcers. Cochrane Database of Systematic Reviews. In: The Cochrane Library, Issue 2, Art. No. CD001836. Disponível em: http://cochrane.bvsalud.org/doc.php?db=reviews&id=CD001836