Qual o significado clínico das palpitações?

| 21 dezembro 2015 | ID: sofs-21761
Solicitante:
CIAP2:
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Recorte Temático:

As palpitações constituem uma queixa comum na prática clínica, mas são também um sintoma muito inespecífico: pacientes podem perceber pequenas modificações nos batimentos cardíacos (na frequência ou força de contração deles), sem que isso se correlacione a arritmias cardíacas importantes; por outro lado, arritmias cardíacas são muitas vezes assintomáticas. As palpitações são, portanto, um indicador pouco preciso dos distúrbios do ritmo.


Algumas variáveis ajudam na definição do significado clínico desse sintoma, e são de fácil obtenção durante uma anamnese e exame clínico cuidadosos.

1)      Probabilidade de doença cardíaca subjacente:
Pacientes idosos e/ou com múltiplos fatores de risco cardiovascular estão mais sujeitos a arritmias; ao contrário, jovens hígidos que se queixam de palpitações dificilmente terão doença cardíaca ou arritmia importante que justifiquem o sintoma;

2)      Descrição das palpitações:
Na maioria das vezes a palpitação é percebida como uma “falha”, “arranco” ou um batimento mais vigoroso, e isso se deve à presença de extrassístoles isoladas, um achado benigno. Se o relato for de palpitações taquicárdicas com início e término súbitos, onde o paciente consegue definir aproximadamente a duração do sintoma, é apropriado pensar nas taquiarritmias por reentrada e a investigação cardiológica está bem indicada.

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 3)      Sintomas associados:
Palpitações associadas à angina, hipotensão, lipotímia ou síncope precisam ser esclarecidas;

4)      Exame do aparelho cardiovascular:
No exame físico, avaliar se há indícios de cardiopatia subjacente: desvio do impulso cardíaco apical, bulhas acessórias, sopros cardíacos, tudo isso sugere a presença de doença cardíaca estrutural e aumenta a probabilidade de que as palpitações estejam relacionadas à taquiarritmias significativas;

5)      ECG basal:
Avaliar se há indícios de cardiopatia estrutural como: sobrecargas de câmaras, bloqueios de ramo, síndrome de pré-excitação, aumento do intervalo QT ou áreas de infarto prévio.

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Muitas vezes as palpitações são causadas por transtorno de ansiedade, ataques de pânico, uso de álcool e/ou nicotina. A conduta médica deve ser direcionada para tais questões, e não para uma pesquisa de doença cardíaca.

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A indicação de exames cardiológicos mais dispendiosos como o Holter de 24 horas, o ecocardiograma e o estudo eletrofisiológico deve ser criteriosa, e depende do contexto clínico. Um jovem que descreve a sensação de batimentos isolados, ocasionais, ainda que incômodos, mas com exame clínico normal, só merece a orientação de que extrassístoles são comuns e inocentes. Ao contrário, palpitações taquicárdicas em indivíduos com outras evidências de acometimento cardíaco ao exame clínico merecem investigação adicional.

É comum que o médico tenha receio de perder a oportunidade de diagnosticar uma arritmia que ameaça a vida do paciente, mas tal receio conduz ao uso excessivo de testes diagnósticos, sem benefícios. Na grande maioria dos pacientes as palpitações têm uma causa benigna, e uma investigação cardiológica não se justifica. A abordagem desse sintoma deve seguir os preceitos da prevenção quaternária, definida como a detecção de indivíduos em risco de tratamento excessivo para protegê-los do sobrediagnóstico e de intervenções médicas inapropriadas.

Bibliografia Selecionada:

  1. Branch Jr, WT. Office Practice of Medicine, 4th ed. Saunders, Philadelphia, 2003.
  2. Tratado de Cardiologia da SOCESP. Nobre, VF; Serrano Jr, CV. Manole, Barueri/SP, 2005.
  3. Zimetbaum, P. Josephson, ME. Evaluation of Patients with Palpitations. NEJM, 1998; 338 (19):1369-73.
  4. Goldman’s Cecil Medicine – 24th ed. Elsevier-Saunders, Philadelphia, 2012; 246-247.
  5. Norman AH, Tesser CD. Prevenção quaternária na atenção primária à saúde: uma necessidade do Sistema Único de Saúde. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro 2009; 25(9):2012-2020.