Quais os cuidados para o tratamento odontológico de pacientes com sífilis?

| 28 janeiro 2015 | ID: sofs-17380
Solicitante:
CIAP2: , ,
DeCS/MeSH: , ,

Os pacientes de uma Doença Sexualmente Transmissível (DST) apresentando lesões orais de sífilis devem ser tratados dando prioridade às lesões dos tecidos da mucosa oral, deixando o tratamento dentário para um segundo tempo, a não ser que o mesmo apresente sintomatologia de dor odontogênica (1). A preocupação durante o atendimento a pacientes portadores da sífilis reside no fato de que as DST possibilitam um envolvimento oral considerável. Todas as formas de DST são contagiosas e podem contaminar os instrumentos odontológicos, resultando em infecção acidental de outros pacientes ou mesmo do cirurgião dentista.
As lesões secundárias mais frequentes da boca incluem: máculas sifilíticas – lesões maculares que aparecem no palato duro e manifestam-se como lesões vermelhas, firmes, ligeiramente elevadas; pápulas sifilíticas – são lesões raras que se manifestam nódulos arredondados firmes, vermelhos, com centro ulcerado acinzentado geralmente na mucosa jugal ou comissuras; placas mucosas – as descrições são variadas e incluem erosões ou úlceras rasas recobertas por um exsudato mucoso acinzentado e bordos eritematosos. Podem aparecer em qualquer parte da boca. Estas lesões podem coalescer formando lesões serpentiformes ou às vezes já aparecem com este aspecto (2).
O tratamento da sífilis necessita de avaliação individual e de uma abordagem terapêutica individualizada. O tratamento de eleição é a penicilina. A dose e o esquema de administração variam de acordo com a fase da doença, envolvimento neurológico e estado imunológico do paciente. Para pacientes com alergia comprovada à penicilina, a doxiciclina é a segunda linha de tratamento, embora tetraciclina, eritromicina e ceftriaxona também tenham demonstrado atividade antitreponêmica (3).


Complementação:

A sífilis é uma doença de fácil diagnóstico e, seu tratamento, quando executado precocemente, é rápido, não deixa sequelas e, é de baixo custo, sendo o cirurgião-dentista um profissional privilegiado para o diagnóstico e tratamento precoces desta manifestação, pois as lesões na cavidade oral são indicadores da enfermidade. O profissional da Odontologia deve conhecer esta doença já que a boca é a localização extragenital mais comum das lesões sifilíticas (4).
É imprescindível o uso dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI), bem como a execução de todos os procedimentos de biossegurança, a fim de, não apenas evitar a contaminação cruzada entre os pacientes, mas, também, a contaminação do próprio profissional de saúde (5).
A sífilis é causada pelo Treponema pallidum, espiroqueta que sobrevive somente em superfícies úmidas, portanto, as maneiras primárias de transmissão são as venéreas ou da mãe para o feto.
A infecção primária é concentrada em adultos jovens, sendo diagnosticada, mais frequentemente, no sexo masculino. Quando não tratada de modo adequado, a doença transcorre progressivamente, determinando seus estágios de sintomas. O primeiro estágio, denominado sífilis primária, torna-se evidente, clinicamente, duas a três semanas após a inoculação inicial. É caracterizado pelo cancro, que se desenvolve em áreas de inoculação. A genitália externa e o ânus são os sítios mais comuns, e as lesões iniciam-se como pápulas, que sofrem uma ulceração. O cancro duro sifilítico ou primário tem ocorrência muito alta na cavidade oral e quando atinge a língua e lábios a úlcera é profunda de base endurecida, bordos elevados, crateriforme e indolor. Quando é inoculado no palato duro, mostra lesão na forma de úlcera rasa de fundo esbranquiçado e halo eritematoso ao redor, de contorno irregular sem bordos elevados.
O estágio seguinte, conhecido como sífilis secundária (disseminada), pode ser diagnosticado clinicamente quatro a dez semanas depois da infecção inicial (5).
Os sintomas sistêmicos frequentemente ocorrem durante essa fase. Os mais comuns são a dor de garganta, mal-estar, cefaleia, perda de peso, febre e dor musculoesquelética. As erupções também podem envolver a cavidade oral e se apresentam como áreas maculopapulares, vermelhas. Adicionalmente, cerca de 30% dos pacientes apresentam áreas superficiais irregulares de necrose da mucosa com coloração acinzentada, conhecida como placas mucosas. A membrana superficial pode ser removida, revelando o tecido conjuntivo subjacente cruento. Estas se encontram em qualquer superfície da mucosa, porém são mais comumente encontradas na língua, lábios, mucosa jugal e palato. Ocasionalmente, durante este momento, podem surgir lesões papilares, que se assemelham aos papilomas virais e são conhecidas como condiloma cuminatun (3).
Após o segundo estágio, os pacientes entram em um período assintomático, livres de lesões e sintomas, conhecido como sífilis latente. Este período de latência pode durar de um a vinte anos, após o que 30% dos pacientes desenvolvem o terceiro estágio, conhecido como sífilis terciária.
Esta fase inclui a mais séria de todas as complicações e pode causar doença cutaneomucosa, cardiovascular e/ou neurológicas (envolvimento do sistema cardiovascular ou nervoso tem sido chamado de sífilis quaternária).
Nesta fase ocorrem inflamações granulomatosas conhecidas como goma sifilítica, que na cavidade oral atinge principalmente o palato e eventualmente a maxila na forma de nódulos granulomatosos que se ulceram, promovendo intensa necrose dos tecidos moles, deixando os ossos descobertos com consequente perda óssea. Uma manifestação clínica como sequela é a perfuração do osso palatino provocando comunicação buco-sinusal. A goma na língua é mais rara, antigamente, juntamente com o cancro sifilítico, era confundida com lesão de carcinoma espinocelular, quando na verdade não tem relação entre estas duas entidades patológicas (3).
Somente nos dois primeiros estágios, um paciente com a sífilis é altamente contaminante, mas as gestantes também podem transmitir a infecção durante o estágio latente. A transmissão maternal, durante os dois primeiros estágios de infecção, quase sempre resulta em aborto, natimorto ou bebês com malformações congênitas. Quanto antes a mãe tenha tido a infecção, menor será a chance de infecção fetal. Infecções do feto podem ocorrer em qualquer momento durante a gestação, mas as sequelas não começam a se desenvolver até o quarto mês de vida intrauterina. As mudanças clínicas secundárias à infecção fetal são conhecidas como sífilis congênita (5).

Atributos APS: O acesso ao cuidado médico e odontológico ao portador de sífilis deve ser garantido em toda e qualquer fase de seu tratamento, visando acompanhar seu estado de saúde geral e promover os cuidados necessários ao seu bem-estar. A longitudinalidade é essencial para acompanhamento da evolução do paciente, principalmente gestantes com sífilis, fazendo com que elas façam o tratamento completo, serão evitados casos de sífilis congênita e todas as suas complicações, o que permanece um grande problema de saúde pública no Brasil. Como elementos fundamentais no enfrentamento da transmissão vertical, as ações de diagnóstico e prevenção precisam ser reforçadas especialmente no pré-natal e parto; porém idealmente essas ações seriam mais efetivas se realizadas com a população em geral, ainda antes da gravidez ocorrer (6).

Educação Permanente: Por meio de ações informativas/educativas pode-se promover maior conscientização da população em geral e, especialmente, das populações mais vulneráveis (prostitutas, usuários de drogas intravenosas, etc.) com relação às DST; a fim de que haja uma busca mais precoce dos serviços de saúde pelos indivíduos e parceiros, tornando as Unidade de Saúde a porta de entrada para esses pacientes, reduzindo assim a automedicação e a procura da resolução do problema em farmácias. Além disso, a observação de sinais e manifestações orais por parte do cirurgião-dentista, é essencial para o diagnóstico precoce de algumas doenças. Você conhece as manifestações orais provocadas pelo vírus HIV?

Bibliografia Selecionada:

  1. SONIS et al. Princípios e Prática de Medicina Oral. Ed. Guanabara Koogan, 2001.
  2. Leão JC, Gueiros LA, Porter SR. Oral manifestations of syphilis. Clinics, 2006; 61(2):161-6.
  3. Neville BW, Damm DD, Allen CM, Bouquot JE. Patologia Oral e Maxilofacial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
  4. BORAKS, S. Diagnóstico Bucal. Ed. Artes Médicas, 1996.
  5. SANTOS, G. A.; CERCATO, R. F.; ELIAS, C.; ELIAS, R. Sífilis: Um Problema de Saúde Pública. Notícias e artigos, Acervo Cispre, 2005. Disponível em: <http://www.cispre.com.br/acervo_detalhes.asp?Id=44 Acesso em: 29 jan 2015.
  6. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST/AIDS. Diretrizes para controle da sífilis congênita: manual de bolso / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST/Aids. – 2. ed. – Brasília: Ministério da Saúde, 2006. – (Série Manuais 24). Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_sifilis_bolso.pdf> Acesso em: 29 jan 2015.